quinta-feira, 17 de outubro de 2013

A Divisão 148 se Rende

49.

O irritante general Crittenberg enviou um ofício ao general Mascarenhas: “A Divisão de Infantaria Brasileira foi a única Grande Unidade que cumpriu integralmente a missão recebida. As outras, 92ª.Divisão Americana, a 10ª.Divisão de Montanha, a 1ª.Divisão Blindada e a 6ª.Divisão Blindada Sul-Africana, pouco progrediram e sofreram grandes perdas. A Divisão Brasileira recebeu, dentro de Montese, só numa  noite, mais granadas do que todas as outras somadas, sem arredar pé das posições conquistadas.” Brayner observou a reação do general Mascarenhas enquanto ele lia, mas o veterano soldado parecia de pedra. Talvez pensasse que o cowboy já não estava tão irritante assim. Afastou o ofício para a pilha de papéis ao lado, e virou-se para Brayner. “Vamos cuidar do que vem pela frente. Vamos avançar sem parar. Nossos aliados gostam de nomes pomposos. Agora chegou o momento da Grande Ofensiva.” A premissa da Grande Ofensiva era avançar sem parar, avançar o mais que pudessem cada dia, avançar até as pernas não aguentarem e o combustível sumir nos tanques. Mas o avanço tinha um sentido: deslocavam-se as unidades brasileiras em direção ao norte, depois de cobrir o avanço da 10ª. Divisão de Montanha que marchava para Bolonha. As unidades eram o Onze de São João del Rey, o Sexto e o Primeiro Regimento de Infantaria. Avançavam pelas estradas poeirentas do Vale do Pó, ao longo dos rios Panaro e Taro, já próximos a vila de Fornovo de Taro. Esta era uma vila cercadas de parreirais, casas de pedra brilhando ao sol, equilibradas nas curvas da estrada rente aos abismos dos contrafortes dos Apeninos, estrada que levava para Bolonha, para o norte, para Berlim. E de lá saiu o primeiro ataque, pegando de surpresa os brasileiros. Foi uma barragem violenta de intenso fogo. Granadas e tiros de canhão explodiam de todo lado. Enquanto buscavam proteção nas valas da estrada e nas barrancas do Taro, os oficiais trataram de se informar quem estava ali com tão formidável poder de fogo. E logo descobriram. “É a 148, uma Divisão Panzer. Uma unidade de elite. Eles combateram sob o comando de Rommel no Afrika Korps. Vai ser uma parada dura” disse o coronel Nelson de Melo, comandante do Sexto. “São duas divisões” disse o major João Carlos Gross “está com eles a Divisão Bersagliere, italiana. Eles vão cobrar um pedágio caro para nos deixar passar.” “Eles estão metidos dentro dos muros da vila, acho que podemos preparar uma surpresinha para eles.” Os três comandantes dos três regimentos de infantaria da FEB acertaram um plano de ação, onde o fundamental era a rapidez. “Vamos envolvê-los” disse Nelson “se der certo eles ficarão imobilizados.” E assim o Onze se estendeu pela ala esquerda, ao sul de Fornovo, com grande rapidez e cautela para não ser observado. O Primeiro se deslocou para a ala direita, ao norte da vila. E o Sexto avançou pelo eixo central, chamando a atenção para si dos defensores da fortaleza, que ignoravam o ataque pelos flancos.
Ao final da tarde, os brasileiros apertavam as Divisões de Hitler em suas posições como se tivessem uma torquês. “Eles estão cercados. Agora é uma questão de tempo” disse Gross. Ao anoitecer apareceu um jipe com bandeira branca. O coronel Melo foi taxativo. “Os senhores estão cercados. Rendam-se incondicionalmente. Vamos tratar dos vossos feridos e terão toda a proteção das leis da guerra.” Os emissários se retiraram. A noite houve uma tentativa desesperada de romper o cerco. Ao amanhecer novos emissários aceitaram a rendição incondicional. Uma neblina cobria a vila e os campos ao redor. E por fim, após duas horas de negociação, começaram a surgir da névoa os vultos do exército derrotado. Era uma longa fila de homens cansados, abatidos, sem esperança e orgulho, que passavam diante das duas mesas onde estavam os oficiais e iam depositando as armas.

Quem comandava a 148 era o prestigiado general Fretter Pico. Ele entregou sua arma para o general Falconiére, chamado ao local para receber os prisioneiros. Falconiére permitiu que o general alemão conservasse sua arma, até ser internado em Florença. Pedrinho, Atílio e o alemão Wogler assistiam a tudo, quando Pedrinho julgou reconhecer um dos oficiais que interrogava ou conversava com os oficiais prisioneiros. Era o capitão Marcos, que o interrogara depois que saíra do submarino alemão. Seus olhares se encontraram, o capitão se aproximou. “Olá, rapaz. Conseguiu o que queria?” Pedrinho ficou confuso, nunca disse para o capitão que queria alguma coisa. “Estou bem, capitão.” “Que bom que está vivo.” “Obrigado, capitão.” “Você veio longe, meu rapaz. Sabe dirigir um jipe?” “Sim, senhor.” “Preciso de um motorista. Vou falar com teu comandante.” Pedrinho ficou perplexo, porque o capitão deu as costas e avançou para um grupo de oficiais que conversava. No dia seguinte, bem cedo, o general Mascarenhas recebeu um ofício do general Mark Clark: “Queira aceitar as minhas mais calorosas felicitações pela brilhante ação das tropas brasileiras ao capturar a 148ª. Divisão de Infantaria Alemã. A captura de tantos homens, veículos e cavalos, constitui uma prova do espírito combativo da FEB e representa o ponto culminante da organização da FEB e da esplêndida contribuição dos brasileiros para o nosso sucesso no teatro de guerra da Itália.” E como se não bastasse, chegou outro ofício, este assinado por Crittenberg: “Vossa ação contínua e agressiva contra as colunas inimigas que tentavam desembocar no Vale do Pó levou-os á confusão com pesadas baixas, ação essa que resultou com a rendição dos Generais Comandantes da 148ª.Divisão Alemã e de uma Divisão Italiana, num total de 14.779 prisioneiros de guerra e grande quantidade de material vital. Meu General, os resultados obtidos pela FEB, sob o vosso elevado comando, constituem um alto feito militar que vos concederá um lugar preeminente na história dessa guerra.” Enquanto os oficiais liam os ofícios e se regozijavam, fazendo piadas com a mudança de atitude dos americanos, Pedrinho dirigia o jipe com o capitão Marcos ao seu lado, tomando cuidado para não atropelar nenhum dos milhares de soldados que infestavam a rodovia. O Alemão e o Gago Atílio viram quando ele passou bem perto, orgulhoso, e acenou para eles. Depois viram que rumava para o norte, e desapareceu numa curva da estrada que circundava a montanha.

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