quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Segundo Ataque ao Monte Castelo

28.

No observatório do PC Mascarenhas olha com binóculos a figura de Zenóbio, agitado, gesticulando. “O que está havendo?” pergunta a Brayner. “A informação que temos é de que o capitão Uzeda chegou lá em cima, general.” “Graças a Deus, sabia que podia confiar nesses rapazes!” “Mas não temos como nos defender de um contra-ataque de blindados, se houver um.” “Não me irrite, Brayner. Não seja derrotista.” “O Uzeda disse que está lá sozinho, sem cobertura, general.” “O que? Como? E a cobertura dos americanos?”  “O capitão Uzeda nos comunicou que não viu nem sinal da 370. Simplesmente não apareceram.” “Não acredito nisso. Eles não nos deram nem um aviso?” “Nada. Nossos rapazes estão lá expostos a um ataque de blindados que já começou. O capitão Uzeda deu ordem de retrair, mas eles ainda estão na cota 800, bem vulneráveis. Convém dar a ordem de retrair até nossas linhas, pois não sabemos nada dos americanos.” Mascarenhas deu alguns passos a esmo e parou de repente. “Avise o Zenóbio. Diga para ele dar a ordem de retrair até nossas filas.” Zenóbio atendeu calmamente, mas com os dentes rangendo. “Entendi, Brayner, já me comuniquei com o Uzeda, eles estão flanqueados lá em cima. Vou mandar retirar antes que sejam cortados pelo meio.” Nilson passou o rádio para Uzeda. “Positivo, general, vamos retirar enquanto dá.” Uzeda se ergueu um pouco e olhou ao redor. Toda a tropa estava em posição defensiva, granadas e morteiros explodindo ao redor, os tanques alemães avançando sem vacilar e atirando com os canhões 88 mm. “Retrair!” berrou Uzeda “retrair, retrair!” a ordem foi passando ao longo das filas e a grande massa de soldados começou a descer a montanha em acelerado, protegendo-se nas dobras do terreno, atrás de pedras e de troncos de árvores. “A quem interessa isso?” gemeu Zenóbio. “Uma ação inimiga exatamente no flanco abandonado pelos americanos! Que interpretação podemos dar?” “Senhores” disse o general Mark Clark “a tentativa foi satisfatória, chegamos a conquistar posições dos alemães. Mas o contra-ataque foi muito forte. É evidente que não vamos desistir. Vamos fazer uma nova tentativa. Imediatamente.” “Se me permite, general” disse o general Crittenberg “antes precisamos fazer uma avaliação realista do que aconteceu no ataque.” “Seja breve, por favor.” “Na minha opinião os brasileiros não mantiveram as posições conquistadas e isso criou um efeito em cadeia que resultou no fracasso de toda a operação.” Na cozinha daquela casa de pedra, estavam cinco homens: os generais americanos Mark Clark e Willys Crittenberg,  o general Mascarenhas de Moraes e o major Brayner, mais o major Vernon Walters, oficial de ligação e tradutor. Mark Clark era um homem de mais de dois metros de altura, mas sutil e refinado no tratamento com seus colegas. Crittenberg tinha o temperamento germânico, era rude e direto. A observação que fez deixou a todos num silêncio embaraçoso. Mascarenhas olhou para o tradutor como se não tivesse entendido. Ele repetiu as palavras. Mascarenhas fez um breve aceno com a cabeça, ergueu os olhos para Crittenberg: “Discordo do senhor. Pelo que pude observar o motivo do fracasso da operação foi a falta da cobertura encarregada ao vosso 370º- Regimento de Infantaria, que simplesmente não apareceu no local combinado.” “Pelo que sei, general Mascarenhas, os seus soldados nem sequer procuraram uma forma de se estabelecer com firmeza no local onde chegaram.” “Fomos atacados por tanques, tínhamos o flanco desguarnecido, porque o 370 não apareceu.” “Acho que faltou vontade de fincar o pé e enfrentar os alemães.” “Senhores, senhores” interviu Mark Clark “vamos ter tempo de analisar isso. Tenho ordens lá de cima para não deixar a coisa esfriar e iniciar imediatamente um novo ataque.” “Imediatamente, general?” Mascarenhas consultou o relógio. “Meia-noite. O senhor quer dizer agora?” “As ordens são claras. Precisamos chegar em Bolonha antes do Natal, faltam exatamente trinta dias. As pressões são enormes. Eisenhower, Churchill, Stalin, até o Montgomery, todos eles, querem ver a Linha Gótica cortada ao meio e essa é nossa missão. Cortar a Linha Gótica. Vamos atacar dentro de uma hora.” “General” disse Mascarenhas “compreendo sua posição, mas vamos cair na mesma armadilha. No dia de hoje não tivemos cobertura pelos flancos e nem cobertura aérea. Com essa neblina os aviões não levantarão voo e eu me questiono se as tropas estarão recompostas para voltar a subir, sem descanso e sem uma preparação melhor para o ataque.” Crittenberg começou a esboçar um sorriso mas Mark Clark o cortou elevando a voz. “Também compreendo sua posição, general Mascarenhas, mas a decisão não é nossa. Temos ordens a cumprir. Vamos preparar o ataque.” Mascarenhas, Zenóbio, Cordeiro de Farias e Brayner falaram durante muito tempo em voz baixa ao redor da mesa de madeira, olhando o mapa amassado diante deles. “Tudo que podemos fazer” disse Mascarenhas “ é cobrir nosso flanco esquerdo com gente nossa, para não termos outra surpresa dessas.” “Vamos mandar para o setor uma Companhia do 6º-, ela nos dará a cobertura que os americanos não deram.” “As tropas estão exaustas” disse  Brayner “e um novo fracasso pode ser nocivo para o moral.” “Não temos mais tempo para divagações, major. Vamos com o que temos, vamos incentivar os homens, dar aos capitães ordens precisas, mas vamos subir essa montanha e cumprir a missão.” E assim, as 2:30 da manhã, os pracinhas receberam ordem de tomar posição para novo ataque. Lentamente foram se posicionando atrás dos tanques americanos, foram se deslocando ao longo da estrada esburacada pelas bombas, buscando proteção nas casas de paredes destruídas das fazendolas do caminho. Ás três da manhã foi chegando reposição de balas e granadas. Ás cinco, o rancho foi distribuído: café preto, bolachas e duas barras de chocolate. Os homens sentiram uma ponta de conforto. Ás sete uma cerração escura cobria tudo. Ás oito da manhã foi emitida ordem de avançar contra o inimigo. Os tanques começaram a se mover. Pedrinho abriu os olhos quando levou um empurrão do gago Atílio. Quevedo acendeu um cigarro: “Pode ser meu último.” Todos olharam para ele com censura, mas o Alemão apanhou um cigarro e acendeu-o. E deu uma risadinha. A tropa brasileira, pela segunda vez, começou a caminhada tensa e dura para o cimo do Monte Castelo.

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